segunda-feira, 24 de agosto de 2015

vencimento de anuidade

Passamos mais uma porta. Para ser mais precisa, passámos a 34ª porta. Devo confessar que não estava animada com mais esta passagem. A 33ª viagem revelou-se, entre momentos de nova e desconhecida felicidade, pejada de poços, penosas colinas e insalubres vales que depois de esforçada escalada se revelaram inférteis, desprovidos de cor. Faltava-lhes quase sempre a verde esperança da natureza renovada, a forte correnteza das águas límpidas e refrescantes de um rio, a transparência do vento que nos faz avançar. Faltava-lhes a essência que nos faz aproveitar a viagem e gozar a recompensa de tal esforço. E assim se passou mais um ano, entre esforçadas golfadas de ar necessárias à sobrevivência e a manutenção de uma esperança que não nos fizesse desvanecer. Alimentámo-nos com sonhos de algodão doce e belos fios de ouro. Amparámo-nos na bela e frágil costureira, que nos mostrou um mundo de olhos brilhantes e sorrisos rasgados - o combustível necessário à travessia. Agradecemos-lhe por isso. Seremos-lhe eternamente gratos. Tal como o seremos a todos os seres de luz, guerreiros de asa branca que intervindo delicadamente nos foram ofertando as ferramentas necessárias à passagem. E foram precisamente estes seres de luz, guerreiros de asa branca que no dia, apesar de distantes, se fizeram presentes. Não é todos os dias que somos acordados pelo carteiro que transporta um presente cozinhado no coração e tecido com todo o carinho que esse ser traz em si. E que apesar de distante, preparou para que fosse entregue na hora certa.
O dia, passámo-lo sozinhos. Fomos à feira, local onde a vida fervilha, local sempre apreciado. Fomos à biblioteca, espaço de encontro, sala de extrema preferência e devoção. Recebemos sorrisos e distribuímos carinhos. Fomos abraçados e lembrados. Ao fim da tarde, fomos até à casa materna, berço da nossa nação. Espaço de amor e compreensão fecundos onde mais uma vez bebemos raios de sol e tempestades de esperança.
Como somos gratos por todo o amor que recebemos!
Cruzada que está mais uma porta, fica-nos a ânsia do desconhecido, a esperança no novo, mas acima de tudo, um olhar mais humanizado e treinado na aceitação.
 
[Apesar de não o gostar, este foi um dia meu, um dia em que me ofertei a mim mesma e pratiquei a arte da aceitação.]
 
Alice!

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

226º dia

Gosto destas chuvas de verão. Os dias ficam mais calmos, as árvores de um verde mais profundo e calmante, o cheiro a terra molhada invade-me o olfato e a pele e logo me traz à memória lembranças da infância. Sinto que respiro ao mesmo ritmo da terra molhada, calma e pacificamente. Sente-se afrouxar o rebuliço e a exacerbada felicidade de ser verão. As ruas ficam mais vazias, os momentos de silêncio tornam-se pequenas joias escondidas nas gotas que escorrem das folhas das árvores, dos telhados e dos fios do telefone. A água fica mais quente e eu volto a ter oportunidade de me esconder debaixo do casaco. Adoro estes dias de chuva no verão.