terça-feira, 31 de outubro de 2017

De quando nos surpreendemos

Hoje estou em modo Joker. Apetece-me muito rir, mas não pelos melhores motivos. Apetece-me disparatar, gozar, apontar o dedo, escarnir e outras coisas más que geralmente reprovo. Mas este é o meu momento de glória. É quase assim um momento de enorme esclarecimento e lucidez e por isso vou gozar desta consagração "à grande e à francesa". Que me desculpe toda a gente, mas tem de ser.

Hoje bati com os olhos num livro. Um livro que eu queria muito ler mas o orgulho não me permitia fazê-lo. Contudo, hoje foi o dia em que tudo aconteceu. Estava o dito enlevado sobre um pedestal  quase invisível, imponente, orgulhoso de si, tal como um bom livro deve estar. Movida pela curiosidade [que muitas vezes me lixa] pedi para o ler. Percorri o edifício em direção à minha sala de olhos cravados naquele texto. Tentando sorver todas as palavras, todas as ações, esperando ansiosa por um enredo seguido de um desfecho que me arrebatasse. Estava disposta a tombar de nariz no chão só para poder usufruir daquele momento único que me faz quase ter um orgasmo literário. Mas esse momento não chegou. Voltei a ler a última página, e a penúltima e a antepenúltima, não fosse ter-me escapado o essencial pelo caminho. E nada. Mesmo nada. Apenas um enredo assim-assim, meia leca e treca, sem emoção, sem pica, sem twist, sem riso, sem surpresa. É isso... sem surpresa. Só assim... uma cena banal. Mais uma história do tempo do arroz doce já frio. 
Fiquei triste. E desiludida. Ainda andei à procura do que tinha perdido, mas depois descobri que o que procurava não estava lá. É pena.
Mas ao mesmo tempo, dá-me um gozo tão grande descobrir isso. Ai que grande gozo me dá. Fico assim com um sorriso maior que o do Joker e a maldade sobe-me à menina dos olhos. Maldade daquela boa, daquela que me fez sofrer muito mas que aprendi a usar para crescer.
Feliz Halloween para tod@s!

De como estamos

Perguntam-me muitas vezes como estou. Demasiadas vezes. E de quase todas essas vezes, não me apetece responder. Não porque esteja mal. Talvez até esteja muito bem. Simplesmente não me apetece responder. Estou cansada dessa pergunta. Acho-a gasta e sem personalidade, sem conteúdo. Sem verdadeiro interesse de saber como está o outro. É quase um proform [veem como estou básica e direta?], uma cena instituída e que, por hábito ou preguiça utilizamos já sem pensar. Por isso, é muito provável que durante uns tempos me escuse a perguntar como estão, se foram ou já voltaram. Tentarei ser mais direta (esforço brutal à minha natureza complicada mas já cansada e sem paciência para floreados) e concisa. Não me levem a mal nem me concluam bruta. Simplesmente não me apetece perder assim muito tempo com... cenas, quadros e pinturas. 
Então, quando receberem mensagens, emails ou outras comunicações aqui da pessoa, estejam já a contar com a pergunta que realmente interessa, sim? Não fiquem pasmados ou assustados. Sou eu mesma, mas mais rápida.

sábado, 21 de outubro de 2017

Do outro lado

Ontem foi dia de passeio. Foi dia de visita. Dia de abraçar a minha outra família. Aquela que ficou do meu outro lado. Aquela que continua lá, do outro lado da minha margem, do lado de lá do manto de nevoeiro. Aquele lado continua a  ser o meu tudo, o meu todo. O meu lado bom. O meu lado sarado. O lado pacificado. O lado sossegado. 
Estava tudo igual mas já nada era igual.
Lá, continuo a ser eu. Mas apesar de já não o ser, sou agora parte da família. Partilho laços e histórias. Desfio o fio da memória e teço as peças que trago há muito aqui guardadas.
Inaugurámos um novo lugar - o da gratidão e do afeto profundo. Demos lugar ao reconhecimento e ao carinho que sempre existiu mas raramente havia sido tornado vocábulo. Foi muito bom rever o meu outro lado - o meu Sol da Escandinávia, os girassóis do meu prado, as extensões plenas do meu ser. Mas no correr dessa aventura, agitaram-se-me as águas, correram-se-me os rios e agigantaram-se as montanhas. Voltei a viver o meu tempo durante algum tempo. Não o tempo que eu desejaria, que eu preciso, mas o tempo que me foi concedido pelo Tempo.
Resta-me estar grata ao Tempo por me ter dado tempo de chegar ao meu outro lado e deixado cuidar mais um bocadinho por aqueles que me são tudo.